Aliança AUKUS gera muito mal-estar na Europa e fúria francesa

Boris Johnson, Scott Morrison and Joe Biden announcing the AUKUS alliance on Thursday morning.

Boris Johnson, Scott Morrison and Joe Biden announcing the AUKUS alliance. Source: AAP

Confira a crônica desta semana do correspondente da rádio SBS, em Lisboa, Francisco Sena Santos.


É muito grande a zanga da União Europeia pelo pacto dos Estados Unidos com o Reino Unido e a Austrália.


Esta zanga europeia está apontada ao presidente Biden por deixar a Europa de fora neste pacto anglófono.


Esta mesma zanga tem aspetos de fúria na liderança política francesa, mas neste caso muito por motivo mercantil: a França vê escapar-se-lhe os 90 mil milhões de dólares de um mega-contrato que estava assinado para fornecer à Austrália 12 submarinos convencionais fabricados pela França. Em vez dos submarinos convencionais de produção franco-australiana a opção para a Austrália, no âmbito deste novo pacto, serão submarinos de propulsão nuclear propostos pelos americanos.


O ministro francês das relações exteriores, Jean-Yves le Drien foi ao limite do consentido na diplomacia entre aliados ao comentar que Joe Biden, embora seja uma figura simpática, tem posturas à maneira de Trump. Usou mesmo uma expressão que se traduz por traição ao afirmar que o anúncio do presidente dos EUA era “uma faca nas costas da França e da Europa”.


O jornal francês Le Monde assume em editorial que “as promessas da nova administração americana de cooperação equilibrada estão agora confrontadas com a dura realidade de um realinhamento geostratégico no qual os europeus são colocados como meros espectadores”.

Já havia mal-estar europeu por Biden ter ativado a retirada do Afeganistão sem coordenação com os europeus.

Agora, para este Pacto do Pacífico, também não houve consultas prévias entre os EUA e os aliados europeus, aliás, também não com o Canadá, outro parceiro na NATO.


Além disso, a Europa vê este Pacto como um gesto de confronto com a China e que é anunciado precisamente no mesmo dia em que a União Europeia, na apresentação anual das grandes linhas de ação política, definiu que em relação à China, a Europa visa a cooperação e não o confronto.


Portugal não fica fora da perplexidade europeia com o que um ex-ministro português da Defesa qualifica como confirmação da alteração de prioridades no mapa geostratégico do mundo.


A prioridade desloca-se do Oceano Atlântico, central nas duas grandes guerras mundiais para, agora, o Pacífico e, especificamente, o Mar da China.


É reconhecido que a Austrália ganha papel fulcral, ao ficar equipada com um mínimo de oito submarinos com a mais alta tecnologia. O sistema de propulsão nuclear vai permitir a esses submarinos permanecer submersos e despercebidos por muito mais tempo e, em caso de conflito, intervir com muito maior eficácia. Esses novos submarinos colocarão a Austrália como força de vanguarda no patrulhamento do Pacífico e do Mar da China.

Um ministro do atual governo português vê com apreensão o risco de proliferação atómica, designadamente naval, na região Indo-Pacífico, com pelo menos o Japão e a Coréia do Sul a reivindicarem também a posse de submarinos atómicos.


A posição oficial portuguesa sobre este tema classificado como “delicado e de relevância histórica” será expressa no âmbito da posição da União Europeia, sendo que há lástima por os Estados Unidos ao elegerem o Reino Unido como sócio preferencial neste Pacto com a Austrália, deixarem de fora a velha parceira que andava outra vez a ser namorada, a União Europeia.


Há unanimidade na análise de assessores político-militares e diplomáticos portugueses na análise de que este Pacto do Pacífico vai impor o desenvolvimento de uma até agora inexistente estratégia militar autónoma da União Europeia, com todo este movimento a ter várias consequências, a saber: por um lado, nova corrida armamentista geral; por outro, a instalação de um cenário de retorno à Guerra Fria, agora já não é com os EUA frente à URSS mas com os EUA frente à China.


Do lado europeu está a ser enfatizado que este acordo EUA-Reino Unido-Austrália vai muito para além dos submarinos atómicos, envolve cooperação cibernética, inteligência artificial, tecnologias quânticas e com tudo a avançar depressa.


Conclusão generalizada de habilitadas fontes portuguesas bem colocadas: nestes últimos dias, o mapa geoestratégico do mundo mudou e tem núcleo central num espaço que envolve a Austrália e a China.

Siga a SBS Portuguese no FacebookTwitter e Instagram e ouça os nossos podcasts


Share
Follow SBS Portuguese

Download our apps
SBS Audio
SBS On Demand

Listen to our podcasts
Independent news and stories connecting you to life in Australia and Portuguese-speaking Australians.
What was it like to be diagnosed with cancer and undergo treatment during the COVID-19 pandemic?
Get the latest with our exclusive in-language podcasts on your favourite podcast apps.

Watch on SBS
Portuguese News

Portuguese News

Watch in onDemand