Ministério da Saúde: a pasta mais visada e atacada no governo português

Web Summit 2021 - Day Two

Ministra da Saúde de Portugal Marta Temido pediu demissã. Ela estava no cargo desde 2018. Credit: Diarmuid Greene/Sportsfile for Web Summit via Ge

Os factos atestam que o cargo de ministro da Saúde é, sistematicamente, em Portugal, o cargo governamental mais debaixo de fogo de interesses vários, profissionais ou económicos.


Nos 48 anos que Portugal leva como regime democrático (desde a revolução de 25 de Abril de 74), Portugal teve 21 titulares do ministério da Saúde.

Há três ministros que estiveram em funções por não mais de 3 meses - Mário Murteira, Pereira de Moura e Jorge Sá Borges, logo nos anos iniciais da democracia, 74 e 75.

A ministra Marta Temido que agora se demite do Governo de maioria absoluta de António Costa entra para o pódio dos ministros da Saúde que mais tempo ocuparam o cargo ao longo dos últimos 48 anos, apenas atrás de Paulo Macedo e Leonor Beleza.

Marta Temido tornou-se a figura política mais popular em Portugal pela forma determinada, a transmitir confiança, como enfrentou a pandemia Covid-19.

Nos meses mais críticos ela explicou todos os dias aos portugueses o estado das coisas, o que estava a ser feito e o que era preciso fazer.

Em Julho de 2020, Marta Temido era para os portugueses o melhor membro do Governo, segundo a uma sondagem da Intercampus para o Correio da Manhã e o Jornal de Negócios. Foi até referenciada num índice de reputação e relação emocional com os cidadãos portugueses como uma das “marcas mais relevantes” no país.

O lado humano de Marta Temido disparou a empatia dos portugueses. Pela primeira vez um ministro da Saúde - no caso uma ministra - era popular e admirada em Portugal.

Chegou a ser apontada, pelo próprio primeiro-ministro António Costa, como potencial futura líder do PS, o partido que governa Portugal com maioria absoluta.

Mas a pandemia foi domada e as velhas engrenagens de ataque a quem conduz o ministério da Saúde reativaram-se.

A maior conquista da democracia em Portugal é o Serviço Nacional de Saúde. Garante cuidados de saúde a todos. Sobretudo garante saúde gratuita a quem não tem dinheiro para pagar os cuidados que recebe.

A redução da taxa de mortalidade infantil é um exemplo desse progresso, um dos casos de maior sucesso nas estatísticas mundiais deste indicador.

Em 1961, a taxa era de 88,8 mortes infantis por 1000 nados-vivos. Em 2021, em vez daquelas 88 – essa taxa desceu para apenas 2 mortes.

O Serviço Nacional de Saúde é um bem reconhecido pelos portugueses, sendo que entretanto cresceu a saúde privada – que se tornou um negócio principal em Portugal.

 O negócio privado precisa de disputar terreno ao serviço público.

Quando um governo, em particular um ministro, trata de robustecer a defesa do serviço público de saúde fica exposto aos ataques, muitas vezes intrigas, lançadas pelo poderoso setor privado.

Aconteceu com vários ministros. De forma mais intensa com a ministra agora cessante, Marta Temido.

Sempre houve escassez de médicos em serviço nos tempos de férias de verão.

Obrigando por exemplo a uma mulher que tem um parto previsto para o Hospital de Almada ou da Amadora, venha a ser deslocada para a maternidade do Hospital de Santa Maria, a escassos 15 quilómetros.

Mas, neste verão, essas transferências e a falta de médicos que as originavam, foram tratadas de forma dramatizada – consideradas como caos na saúde pública.

Ao mesmo tempo, os médicos, classe influente e poderosa, aliciada pelos serviços da saúde privada, desencadearam pressão hostil sobre o ministério da Saúde.

Percebeu-se muita chicana partidária nessas movimentações – a direita política contesta a visão pública defendida por um governo à esquerda, como é o atual.

É um facto que há falta de médicos, de enfermeiros e de auxiliares no SNS português – porque o Estado não pode competir com o que é pago pelos privados, sendo que vários setores políticos defendem que o Estado deve suportar o custo de cuidados médicos recebidos por quem quiser optar pelo setor privado. Essa seria uma opção que enfraqueceria mais, destroçaria, o serviço público de saúde.

 A agora ministra cessante da Saúde, Marta Temido, bate-se para que o SNS seja forte, por isso passou os últimos meses debaixo de fogo nestes últimos meses.

 Apesar de ter sido a política mais popular, agora, após 1414 dias como ministra da Saúde, deixa o governo.

 Quem vier a seguir e continuar a defender o serviço público de saúde sabe que está condenado a ficar debaixo de fogo de interesses poderosos.

Tem sido assim com sucessivos ministros.

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